Jornal Mensal em idioma gírio. Edição 026– Ano 3 – Niterói/RJ, Abril e Maio de 2003

A GIRIA É A CULTURA DO POVO.

Agradeço aos 65.045 internautas que visitaram este espaço gírio, já consolidado como referência na língua portuguesa, tanto no Brasil como na comunidade dos países de lingua portuguesa.
Nesta edição rendo minha homenagem, sem consulta prévia, a um dos monstros sagrados da gíria em nosso país, Bezerra da Silva, que lançou em 2002 mais um CD – “A Gíria é a cultura do povo”. Ou “a gíria é cultura popular”.
Falou e disse, com autoridade, respeito, carisma e seriedade.
Não o conheço pessoalmente, mas acompanho de longa data sua peregrinação. Desde os tempos do programa do Adelzon Alves, na Radio Globo, pela madrugada. Adelzon cunhou muitos bordões gírios que marcaram sua presença no radio.
A trajetória artística de Bezerra da Silva está associada à gíria, não específicamente da malandragem e do Rio de Janeiro, mas de amplos segmentos sociais que têm os mesmos traços sociais e culturais, em qualquer cidade brasileira, como ressalta com grande visão de futuro e compreensão crítica, no asfalto e no morro.
No asfalto, estão supostamente as elites e no morro, que significa favelas, mocambos, palafitas, conjuntos habitacionais sem a menor condição de habitabilidade e amplamente devassados, com suas entranhas de miséria expostas, estão os excluídos, os marginalizados, dissociados e distanciados do processo de conhecimento.
É preciso que se acentue que Bezerra da Silva não é carioca nem fluminense, mas pernambucano.
Como nordestino, exprime sem ódio e sem rancor toda a discriminação que acompanha seus conterrâneos no mundo dos barracos.
Bem diferente de seus antecessores mais próximos, Moreira da Silva e Dicró, nossos “três malandros”. Mas cada um tem um gênero gírio diferenciado.
Moreira da Silva, carioca, foi um pioneiro e é responsável pelo rompimento das convenções e restrições contra a gíria. Admitamos que deu status urbano à gíria, com seu jeitão de “falso malandro”. O “samba de breque” foi o seu caminho para ir estabelecendo uma comunicação fácil e direta entre o mundo malandro e o mundo asfático.
Dicró, fluminense, é contemporâneo de Bezerra da Silva, se debruçou sobre a gíria das comunidades negras, entendendo e explicando a exclusão social que marca essas populações pobres.
Nenhum dos três fez ou faz política, mas tiveram e têm um discurso eloquente, verbalizado na riqueza do idioma gírio. Fizeram-se entender por milhões de brasileiros do asfalto e o principal resgataram a gíria do gueto e do padrão excludente atribuído pelas elites.

A música que dá título ao CD é de autoria de Elias Alves Junior, Wagner Chapell
E carrega a seguinte letra:

“Toda hora tem gíria no asfalto e no morro
porque ela é a cultura do povo

Pisou na bola conversa fiada malandragem
Mala sem alça é o rodo, tá de sacanagem
Tá trincado é aquilo, se toca vacilão
Tá de bom tamanho, otário fanfarrão

Tremeu na base, coisa ruim não é mole não
Tá boiando de marola, é o terror alemão
Responsa catuca é o bonde, é cerol
Tô na bola corujão vão fechar seu paletó

“Toda hora tem gíria...

Se liga no papo, maluco, é o terror
Bota fé compadre, tá limpo, demorou
Sai voado, sente firmeza, tá tranquilo
Parei contigo, contexto, baranga, é aquilo

Tá ligado na fita, tá sarado
Deu bode, deu mole qualé, vacilou
Tô na área, tá de bob, tá bolado
Babou a parada, mulher de tromba, sujou

“Toda hora tem gíria...

Sangue bom tem conceito, malandro e o cara aí
Vê me erra boiola, boca de sirí
Pagou mico, fala sério, tô te filmando
É ruim hem! O bicho tá pegando

Não tem caô, papo reto, tá pegado
Tá no rango mané, tá aloprado
Caloteiro, carne de pescoço, “vagabau”
Tô legal de você sete-um, gbo, cara de pau”

“A gíria é cultura popular
Se liga, amizade
Tá certíssimo”.

São expressões faladas por Bezerra da Silva no final da faixa.

Se o internauta quer conhecer a obra gíria de Bezerra da Silva, aqui vão algumas dicas:
- Grandes Sucessos de Bezerra da Silva;
- Bezerra da Silva ao Vivo
- O melhor de Bezerra da Silva
- Bezerra da Silva (ACERVO)
- Bezerra da Silva (Aplauso)
- Grandes Sambistas (Moreira da Silva, Dicró, Moreira da Silva e Exporta Samba)
- Os 3 Malandros (Moreira, Bezerra e Dicró)
- A Gíria é a Cultura do Povo – Bezerra da Silva.

Remeto os internautas ao Dicionário de Gíria, na 6a. edição, para entender as expressões gírias aqui citadas.
Caso não estejam dicionarizadas, aguardem a 7a. edição que já está com 26 mil gírias!

 

(Serviço: para entender o que está neste JORNAL DA GIRIA compre o DICIONÁRIO DE GÍRIA, de JB Serra e Gurgel, à venda na Saraiva e na Siciliano, a 20 mangos, 20 contos, 20 merréis, 20 reais, 20 barões, 20 paus, 20 pratas, 20 pilas. Se preferir, peça direto ao autor, com direito a autografo. E-mail: gurgel@cruiser.com.br

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